domingo, 28 de setembro de 2008

O divã

       Frases complacentes permeiam minha mucosa. Rodopio na inexatidão de um segundo enquanto respiro e... silêncio: espero o tácito prazer da certeza, fecho os olhos, enquanto reproduzo sons de outros continentes, tant pis, tant pis. Estes, quebrados em pequenos acordes inundam a sala, minha coisa saindo da boca e dizendo tudo o que deveras sinto, sou eu e nada mais.

       Limito-me em ser. Sento-me na poltrona em frente ao divã enquanto o Sr. Invisível limita-se em queixar-se sobre o que deveria sentir. Sinto as dele palavras titubeando na atmosfera, sei que sua fala é quase primitiva, no sentido de não conhecer o que se diz e ouvir somente o que digo, como: circunstâncias, limitar-se, porquê, talvez... (...). Meu pensamento desloca-se no ápice desse tempo inexistente e transmuto-me novamente para trás; quando falava antes sobre eu: rogo a quem toda essa aprendizagem forçada, no deleito obscuro da solidão enquanto sempre vivi sem perceber?

       É o vento soprando, forte, estridente, os papeis querendo levantar vôo, as cinzas formando um pequeno redemoinho e eu aqui; olhando tudo de camarote enquanto penso sobre o que há e sobre todo o resto que não deve existir porque não conheço, ainda não conheci. Preciso respirar, abrir paredes, expandir-me na medida em que os minutos passam e as linhas das páginas são preenchidas de idéias que eu mesma não consigo compreender bem. Ainda, porque ainda ouço o Sr. Invisível falando e falando, agora, sobre o que não sente e como tudo isto incomoda-o.

       E os sonhos são leves, e breves como espuma. Ele é uma dessas pessoas que não percebem ou não aceitam a mágica do porvir, do completar ou talvez: completar-se. Digo a ele que, quando tudo é breve, leve e frágil... devemos então, em vida novamente, completar, do jeito que nos cabe, como nós nos permitirmos. Sr. Invisível me reprime com um olhar fulminante de repulsa e se cala. Então me calo também. Silêncio é tão acolhedor quando não se têm verdadeira vontade para conversar e é tão verdadeiramente sombrio quando se quer falar e tudo é inapropriado e monstruosamente calado demais.

       Meus ossos parecem se fragilizar de acordo com que o tempo passa, sinto o meu corpo querendo ir para algum lado e não tendo saída, os ossos são comprimidos, estilhaçando-se, esfarinhando pouco a pouco e logo estarei rastejante ou enfim livre e elástica. Expandindo e retraindo conforme a condição dos nervos, do mundo e de todo o silêncio, apaziguado ou não por verdades, mentiras ou situações em que tudo pede um só grito.

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