sexta-feira, 15 de agosto de 2008

Fluxu (aeternu)

 

   Disseram-me que “eterno” soa na cabeça depois que disse sobre eterno: ocorreu-me agora que as pessoas são em síntese, eternas, pois, não se conhece o princípio, não se conhece por inteiro e, nem nós mesmos, não nos damos. Não nos deixamos por inteiro, não somos o princípio das coisas, só o começo dos instantes que logo se esfumaça e não se apercebem e não se seguram entre as mãos. Conhece-se o agora, e esse é sem princípio e sem fim, começa sem que se perceba e acaba como um movimento involuntário, quase que como todas as vezes que os olhos piscam por minuto ou o coração bate: eis o eterno das pessoas e o horror de tê-las. Conhece e quer se comer de imediato, mas sabe não poder, sabe não ter tamanho o suficiente; eu não tenho. Meus pesadelos começam aí, onde perco-me em difusas controvérsias sobre o que é poder. Tenho saudade e tenho fome, tenho horror e a paixão que me domina e, no entanto, não posso. Nunca pude. Não me cabem e eu não caibo, a eternidade paira entre a pequena ponte invisível entre eu e a vontade, segue assim: agora não me é preterível, o desejo de sugar inteiro o que se percebe com os olhos, o que quer-se para si absorver do outro, o momento, cada instante que sabe que vai ocorrer e depois não percebe que já aconteceu, a sombra do que não tem princípio fica aí, nesse deslize das sensações que vão sendo atropeladas, uma a uma, pela vontade imensa de se querer cada vez mais e mais a proximidade e a doçura que se sente, agora-já, em toda a língua e sem tocar. Um tracejado, ponte de hidrogênio entre essas duas coisas, pontilhado intenso que não se rompe, e justamente, será por não se tocar? Tudo suspenso no ar.

   Será que devo por mim e por vós explicar o sem fim? Pressupondo que conheces o fim das coisas e todas as coisas, devo explicar o sem fim que é isto que faço ao vir aqui e esvaziar? Sempre tive medo do que não tem fim, uma hora dessas vou ter que parar e calar tudo isso, eu sei. Quando me perguntaste sobre o que não tem princípio, pensei também e achei tão bonito, mas quando penso no que não tem fim: será que eu também não tenho fim ou quando eu tiver fim, qual vai ser o meu fim? Porque desconheço tudo e o medo é algo paralisante. Meu cérebro agora entra numa letargia, já não quero pensar no fim ou no que não tem fim, é que ao mesmo tempo que gosto do fim, quero que algumas coisas não tenham fim e se tiverem, prefiro eu ter fim antes. Mas não adianta, já está na minha frente todo esse pensamento e eu só corro para me alcançar e não desgrudar. Tenho que pensar e fazer um grande esforço. Sacrifico-me todos os dias, em todos os minutos e milésimos de segundo.

Continua...

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