sábado, 19 de abril de 2008

Um esperançoso Vazio

   A vida como o desespero das entranhas mucosas explodindo em pequenos espasmos. Todo o dia como o desespero dos telefonemas não atendidos, das mensagens descartadas, dos afazeres que a verdade dolorosa do pensamento não lhe deixa executar. Vazio.

   Os remédios que tenho de tomar, o manequim com os cachecóis que ganhei de amigos distantes, as bolsas dependuradas à espera de uma mão que as leve para a rua... as roupas amassadas no cabideiro. As bolsas... esperando o vital momento de quando uma delas será enchida e enchida de esperança, dinheiro, cigarros e alguma maquiagem;

   Vejo tudo no entardecer tristonho desse sábado, a cortina branca dum pano indiano caríssimo que agora não tem mais graça nenhuma, os móveis pretos e a minha máquina de escrever que não escreve sozinha, os livros que não se lêem apesar de eu já tê-los engolido inteiros. É o que dizem sobre maiores abandonados e a solidão que faz companhia, e a fumaça que gira, e a parede sangrenta logo atrás.

   Beijos, corpos, amontoados, lençóis que eu estive todo o dia: a espera de um choro ou qualquer sorriso. O caco do meu telefone celular, a doença da tristeza de tê-lo quebrado sem querer, o soco no estômago logo que acordei e a felicidadezinha amena de uma mensagem de bom dia...

   Rodopio dentro de mim mesma, penso estar na rua, caminhando e ouvindo música, indo para a praia, indo tomar sol e ler alguma coisa, encontrar qualquer alguém; não acredito mesmo que a vida possa ser tão frágil a ponto de só poder imaginar algum movimento, algum passo, algum acaso.

   Acontece que todas as vezes é assim, tomo refrigerante, engulo comprimidos, boto pra dentro tragos de cigarro sem gosto, relembro as coisas da noite passada e imagino como será a de hoje; talvez eu não saia, talvez eu saia. E não saberei que bolsa levar, não saberei que sapato usar e muito menos que roupa jogar no corpo. Talvez eu jante, num lugar bonito e aconchegante, e mais talvez ainda a comida estará ruim: estremerecei-me.
Poderia ir ao cinema, assistir ao filme sobre o Bob Dylan, que ainda não morreu, mas não gosto mais de ir ao cinema desacompanhada. Espero qualquer sinal enquanto o sono vem chegando porque o desespero é tanto e a saudade é demais.

   Engulo meu castigo tedioso de nunca ter o que fazer. Não vou reler escritos velhos, muito menos tentar, com o coração aberto, ler o meu livro mal escrito. Não vou na impulsividade navegar na loucura destemida que me chama, porque sou mais, porque sou eu, eu é quem digo e agora estou em ordem. Ouço uma música tranqüilizante, violinos e piano e espio de dentro para fora de mim as fotografias; Diane Arbus, Freaks, Wiktin, Saudek e até mesmo as minhas. Galhos retorcidos, controvérsias, vergonhas...
Insanidade controlada, um gole, um trago, uma luz.

   Uma música que não toca: “Padam, Padam”.

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